

Soltaram mais uma baforada e o cheiro dos cigarros invadiu o ar mais uma vez. Em algum lugar, alguém arrota e dá uma gargalhada histérica. Todos bebem e fumam sem parar, alguns ainda de terno, largados às cadeiras ao redor da mesa. É mais uma terça-feira. Fumamos e bebemos no meio da semana. Grande coisa.
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Uns riem e fazem estardalhaço de suas piadas banais. Outros reclamam da vida e maldizem suas famílias. Terça-feira. Pais de família trabalham amanhã. Hoje à noite, nós vagabundeamos, entre quedas, xingamentos e risos. E cambaleamos até o armário de bebidas para não deixar a alegria escapar. Enchemos copos, entornamos a bebida boca adentro e em seguida as garrafas vazias são arremessadas às paredes gastas. O teto já parece cansado de nós. Está cada vez mais fraco, prestes a ceder. Ninguém se importa. Os cacos de vidro espalhados pelo chão não incomodam.
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A comida acabou. Agora só nos resta o cheiro do tabaco e o gosto amargo do Dreher. Todos continuamos rindo. Contamos as mesmas piadas da semana passada. Todos mostramos os dentes estragados e as gengivas enegrecidas, em sorrisos sinceros, em alegrias falsas. O humor gira em torno de insinuar que o próximo é homossexual, ou talvez corno. Grande coisa.
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Talvez sejamos covardes. Talvez sejamos filósofos. Talvez filósofos covardes. Sim. Todos admitem a condição. Alguns até gostam dela. Alguém vira mais um copo, de olhos fechados, e pronuncia, para todos ouvirmos, a máxima da noite. Uma frase curta que encerra um discurso ao qual ninguém se deu ao trabalho de dar ouvidos. Não nos damos a trabalho algum, afinal. Levanta-se com alguma dificuldade e declara a grande conclusão com a voz enrolada: "A verdade está no álcool!". Ao que é muito aplaudido por todos os presentes. Já estamos todos bêbados. Temos a verdade, e isso nos basta. É o suficiente. É o que nos resta. Festejar a bebedeira, fazer piadas sobre absolutamente porra nenhuma, cantar e vomitar madrugada adentro.
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Em algum lugar lá fora, nossas esposas nos traem, nossos filhos descobrem o sexo e se esbaldam com entorpecentes.
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Pouco nos importa.
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Ainda temos meio estoque de bebidas e muitos cigarros a fumar.